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Música: Uma ameaça ao Estado

  • Foto do escritor: Giulia Freitas
    Giulia Freitas
  • 1 de dez. de 2018
  • 5 min de leitura

Atualizado: 4 de dez. de 2018


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Não há dúvidas de o profundo poder que a música tem sobre o ser humano. O nosso subconsciente é afetado o tempo todo, seja por canções que gostamos de ouvir, ou por aquelas que ouvimos no dia a dia e sem nem perceber, já refletem em nossos pensamentos. A influência musical abrange diversas áreas de uma sociedade, e dentro da política, têm força suficiente para representar posicionamentos e até mesmo induzir alguém em direção aos tais.

Vista como uma das mais conhecidas formas de diversão, a música é uma ferramenta de comunicação capaz de representar ideologias. Mensagens específicas são transmitidas por meio de ritmos e melodias. Canções de conteúdo pessoal e/ou romântico tendem a fazer sucesso. Mas a identificação do público com letras críticas, sejam positivas ou não, podem transformar concepções.

A proposta de uma educação musical já estava presente na Grécia Antiga. As melodias teriam como função inspirar a manifestação das virtudes gregas dentro de cada um. O conceito de “éthos” significava que cada diferente harmonia despertaria uma reação em quem a ouvisse. E foi o filósofo Platão, estudioso do assunto, que a partir de tal teoria, percebeu a aptidão que a música teria para criar transformações na sociedade.

A mente humana é atingida o tempo todo por informações introduzidas durante a vida. Mas muitas vezes, coisas óbvias que deveriam ser lembradas acabam se perdendo. E o refrão daquele hit “chiclete”, que você ouviu na rádio uma única vez, fica gravado em sua cabeça por dias. Assim, a música demonstra a força de sua atuação no subconsciente humano.

Artistas, ao longo da história, têm juntado seu amor à composição melódica a letras que traduzem seus posicionamentos diante de assuntos sociais e políticos. Canções positivas a determinado governo podem ser bem vistas, mas críticas negativas e posicionamentos contrários podem incomodar quem está no poder. O mundo já passou por diversos regimes políticos, mas foi dentro de domínios autoritários que a música encontrou um obstáculo, a censura.

Ditadores, ao redor do planeta, são conhecidos por controlarem o pensamento do público de acordo com seus interesses de governo. O período nazista na Alemanha é um grande modelo de como a música teria sido usada para dominar e limitar o discernimento popular. Com a censura de canções que indicavam os problemas da época, as pessoas deixavam de tomar conhecimento dos fatos. A música sempre foi uma forma de comunicação com maior facilidade de acesso. Um indivíduo analfabeto é capaz de ouvir e compreender a mensagem que uma canção passa. E quando a arte mais acessível deixa de retratar a realidade, a população fica cada vez mais distante do conhecimento de sua própria sociedade.

O exemplo ditatorial é um dos lados negativos da influência musical. Significa a dominação do pensamento a favor de um interesse que não é de todos. Mas há sempre dois lados de uma mesma moeda. Da mesma maneira que a censura interrompe a função musical de apresentar fatos, quando há total liberdade, a música tem a essencial missão de mostrar o que, muitas vezes, está escondido aos olhos do público. Posicionamentos contra um alto poder se mantêm escondidos e retraídos. Um rebelde solitário não atinge ninguém. Mas quando um artista dá voz ao parecer que muitos têm, esses defensores de tal opinião se sentem confortáveis e protegidos o suficiente para não mais calarem sua voz.


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A lista de harmonias escritas como forma de empoderamento e protesto é infinita. Muitas de cunho nacional limitam sua fama a seu país. Entretanto, composições atemporais como Sunday Bloody Sunday, da banda de rock irlandesa U2, não podem deixar de ser citadas. Seu sucesso ao redor do mundo não foi sem motivo. A canção demonstra exatamente o que a banda acredita em relação a tempos de guerra. A verdade de que não há vencedores no meio de tantas mortes. E na letra, o vocalista Bono questiona, “Por quanto tempo devemos cantar essa canção?”.

Em um estilo já mais pop e eletrônico, a banda americana The Black Eyed Peas também deixou registrada sua indignação. A letra de “Where is the Love?” relata diversos problemas sociais e políticos dentro dos Estados Unidos e do mundo. Lançada em 2003, a canção retrata o caos social, a presença do preconceito e da violência, e a falta de combate a esses problemas. Ainda é apresentada uma solução, o amor. A intensa canção continua até hoje servindo como mobilização a favor de um mundo melhor. Em 2017, foi apresentada no festival One Love Manchester, no Reino Unido. O concerto foi organizado pela cantora Ariana Grande, para arrecadar fundos para vítimas de um atentado terrorista na cidade.

No Brasil, o período da ditadura militar rendeu diversas obras que criticavam as autoridades, mas foram censuradas. Composta por Caetano Veloso e Gilberto Gil, “Cálice” ficou conhecida por todos como protesto ao momento político do país. Toda a letra é constituída por críticas. A analogia do título da canção com o verbo “cale-se” mostrava uma reclamação às proibições da época. No mesmo período, a letra de Geraldo Vandré em “Pra não dizer que não falei das flores” incentivava a mobilização contra o governo.

Ainda dentro do mesmo regime, o Brasil continuava a ser criticado. No final da década de 70, Renato Russo compôs “Que país é esse?”. Uma crítica à impunidade, corrupção e todo sangue derramado no país. Proibido de apresentar a canção, ela só foi oficialmente lançada em 1987. Já durante a redemocratização brasileira, Cazuza lançou seu álbum “Ideologia”, em 1988. A sexta faixa de seu disco é denominada “Brasil”. A letra mistura a celebração das conquistas políticas com a indignação da constante corrupção e desigualdade ainda presente.


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Hinos nacionais, além de todas as outras canções, são exemplos cruciais de como a música é a representação de posicionamentos sociais e políticos. O hino tem a função de demonstrar todas as intenções, opiniões e conquistas de um país. E a proposta é que seja cantado com orgulho pelo seu povo.

Representatividade de determinados grupos é uma das muitas funções do mundo musical. O orgulho por seus ideais é cantado, e assim disseminado para novos ouvintes que podem ou não se identificar com certo parecer. A facilidade de memorização de canções, e por consequência, a força que isso tem dentro do subconsciente humano é grande parte de seu sucesso. Seja de maneira positiva ou negativa, o poder de diversas vozes cantando uma mesma letra é inegável. Dentro de questões sociais e políticas, a música é capaz de atingir nossas almas e mudar o mundo. Platão considerou a inovação musical como uma ameaça ao Estado. Segundo ele, as leis da sociedade sempre seriam alteradas se a música também fosse. “A música é uma lei moral. Dá alma ao universo, asas à mente, voo à imaginação, e encanto e alegria à vida e a todos.”

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